O corpo franzino e os traços infantis no rosto de Ana (fictício) revelam a transição da infância para a adolescência. Para a garota, de 14 anos, essa nova fase, por vezes complicada e cheia de mudanças, virá com a responsabilidade de cuidar da pequena Laura (fictício), de apenas 10 dias de nascida. Ana está no universo de meninas, de até 15 anos, que todos os anos dão a luz a cerca de 500 bebês na Paraíba.
De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), de 2004 até 2014, 5.499 mil crianças nasceram de meninas de até 15 anos na Paraíba. Ou seja, 499,9 partos feitos, anualmente, em mulheres nessa faixa etária. A trajetória de Ana é a mesma de Flávia (fictício). As duas iniciaram a vida sexual aos 12 anos e, aos 13, Flávia tinha uma criança no ventre. O ar infantil da menina que embala um bebê se mistura à maquiagem da mulher que teima em antecipar as responsabilidades da vida adulta.
“Tudo é novidade para mim. A sorte que minha mãe e minha irmã me ajudam a cuidar dele”, relatou a mãe do pequeno Luis (fictício), de apenas sete dias.
O desconhecimento sobre os métodos contraceptivos é um dos fatores que estão presentes na realidade da maioria das adolescentes que ficam gestantes. Essa situação pode gerar outros agravantes, como problemas de saúde para a mãe e o bebê. Um estudo feito por um grupo de pesquisa em Saúde Pública da Universidade de São Paulo apresentado à Sociedade Paulista de Pediatria (SPP) mostrou que problemas relacionados à gestação, parto ou pós-parto ocasionaram a internação de 59,5% de mulheres, na faixa etária dos 15 anos 19 anos, em todo o País.
Embora os dados do estudo sejam de 2014, essa é uma realidade contínua, segundo explicou o ginecologista e obstetra do Instituto Cândida Vargas de João Pessoa, Genival Ferreira de Lima. “O pré-natal de uma mãe adolescente necessita de mais cuidado e acompanhamento, porque é uma gravidez de risco. Tem que explicar para elas a importância de tomar as medicações, fazer os exames para evitar problemas, como infecção urinária. Como a parte hormonal delas ainda é deficitária, elas têm uma predisposição maior em ter esse problema”, alertou.
Educação sexual
Para a coordenadora do Núcleo de Estudos de Violência Doméstica contra Criança e Adolescente da Sociedade Paulista de Pediatria, Renata Waksman, a gravidez indesejada que afeta muitas adolescentes é reflexo da falta de educação sexual também em casa, com a família. Ela reforça a falta de maturidade das jovens ao não ter responsabilidade em usar os métodos contraceptivos e ainda o retardo em procurar acompanhamento médico, quando engravidam. “A atividade sexual dos adolescentes está começando cada vez mais cedo. Muitas vezes, as adolescentes engravidam e não sabem.
Fazem o pré-natal tarde ou de maneira inadequada. Tudo isso traz agravantes para a saúde. A orientação de como se cuidar e os perigos que se tem nas relações sexuais é papel dos pais e não somente da escola. Os pais não podem esperar a menina menstruar ou começar a namorar para falar sobre isso”, reforçou.
A reportagem entrou em contato com a Secretaria de Estado da Saúde (SES) para comentar os dados mas, até o fechamento desta edição, não obteve resposta.
Dois partos por dia na Capital
Até setembro deste ano foram realizados 589 partos em adolescentes que deram entrada no Instituto Cândida Vargas, em João Pessoa. Com a média de dois partos por dia feitos em gestantes na faixa etária dos 11 aos 17 anos, o supera o total de procedimentos em mulheres de 18 e 19 anos.
Do Jornal Correio da Paraíba